quarta-feira, 23 de abril de 2008

Ser Humano


Cego. Não. Surdo. Não. Mudo. Não. Insípido. Não. Insensível. Não.

Só estou, só ficarei. Relações humanas não mais enobrecem meu ser. Mas que relação não é humana. Até sozinho comigo mesmo estou me relacionando com um humano. Animal cruel, vil e sem razão alguma, ou pleno dela por inteiro. Nas atitudes mais cruéis dos homens mais vis e que consigo enxergar a verdadeira natureza humana. Coitado de mim, que não consigo ver mais nos homens qualidades, atos nobres, boas ações, nem mesmo em mim. Pessimista, eu? Nem um pouco. Realista, talvez. Porém o mais certo seria dizer sincero, apenas isso. E sincero não significa ser verdadeiro, mas sim confortável.

Estou sentado na ultima fileira do ônibus, aquela de bancos unidos, na qual o contato físico é de certa forma inevitável, mas isso não me incomoda tanto. O coletivo está relativamente cheio. Relativamente cheio significa, em bom português, não estar entupido de gente. Na frente do ônibus entra uma senhora, seu caminhar não é dos melhores, porém também não é dos piores. Meu dilema começa. Primeiro sei que dificilmente alguém irá se levantar, isso costuma acontecer somente em casos de estrema invalides, e às vezes nem assim. O dilema é o seguinte, eu como ser humano, digno do reino dos céus, devo me levantar, e desta forma acenar para o outro lado do ônibus, fazendo com que a senhora atravesse todo o ônibus, aos trancos e barrancos pra se sentar, ou pouco ligar para o que a senhora sente, ou pensando em sua situação devo me erguer e gritar a todos no ônibus que dêem o lugar mais próximo a senhora, ou devo ficar em meu lugar e torcer para que a senhora arrume um bom lugar na frente, ou dentre as varias possibilidades de ação que me resta devo agarrar-me a que mais me agrada?

Sincero não significa ser verdadeiro, mas sim confortável. Entende? Tendo eu varias opções me agarro aquela que mais me conforta. E não venham me dizer que temos de fazer o que e certo, pois o certo só se fez certo por ser recompensado como tal. Ou alguém dentro desta sala acredita que o certo e o errado surgiram de outra forma? Através de uma lei quem sabe, e o que é a lei, além disso, que acabo de dizer, recompensa do que é dito como certo e punição ao seu oposto. Logo não sou verdadeiro, sou confortável, em minha sinceridade.

Cego. Não. Surdo. Não. Mudo. Não. Insípido. Não. Insensível. Não. Sinto, e sentindo vivo, sei quem sente comigo, e me sinto sentindo com eles, mas se meu sentimento não é no sentido que sentes, me desculpe por sentir diferentes.

Imagem de Caravaggio [David and Goliath]

Ps. : Não ia postar hoje, porém varias coisas me fizeram acreditar que hoje se fazia um dia ideal para que eu postasse esse texto. Quem buscar respostas nas perguntas que faço só encontrará mais dúvidas, por isso leia como quem lê os quadrinhos do jornal, e não como quem lê a bula de um remédio tentando encontrar uma doença que o apraz. Não sintas nada por mim, pois não é de mim que escrevo, mas sim dos vários outros que moram comigo dentro de mim.

2 comentários:

Vicky disse...

Agressivo,violento,egoísta,envolvente e nauseante,humano...bem humano.Eu não venho tencionando uma desconstrução da sua idéia,venho apenas comentá-la.E esse texto me faz ora bater palmas em pé,ora dormir na cadeira,sensações extremistas para um texto só,acho que é por causa da pessoalidade.Ao revoir.=*

Mayara Bandeira disse...

melhor é culpar os passageiros da frente, chamando-os de mal-educados, por não cederem lugar à velha, e ficar torcendo para que alguém levante tendo humanidade e piedade para com a velhinha... e assim, ocupar a cabeça pensando nisso e pondo a culpa nos outros. sem esquecer de olhar pela janela depois...
é confortável... para o corpo.
me confortaria a alma levantar e ceder o lugar... e ainda ganhar os louros de boa cidadã. seria interesse puro. e todo mundo sairia bem... meu ego e o joelho da velha.
sei lá mais o que pensar sobre... to com sono.