domingo, 28 de dezembro de 2008

Na janela – 2/2



Estando já cansado deste joguete temporal, e ciente da recente curiosidade do caro leitor quanto ao conteúdo desta nova caixa, porém sem me esquecer do principal que ainda não consegui realizar, que é olhar o céu, retorno aqui a corrente normal do fluxo temporal. Ouviram o barulho? Este som foi o do meu corpo que já caíra neste instante. Levanto-me com as costas doloridas, contudo sem mais machucados, o que me é um alívio. De pé olho para a mala prateada no chão do quarto. A escuridão não me permite uma boa observação do recinto, decido priorizar o levante do toldo antes de desvelar a mala. Tendo arrebentado a corda, subo na cadeira e, inclinando meu corpo para fora da janela, de forma que possa alcançar a ponta da corda, na ponta do toldo, para só então ter a digna possibilidade de levantar o dito cujo. Enquanto meu corpo paira no ar, seguro apenas pela mão, me deparo com a altura que estou e lembro, de supetão, que possuo fobia a tal fato. Sobe-me uma vertigem que passa pela boca do meu estômago, me fazendo tremer as pernas, e continua a subir me causando uma falta de ar ao passar nos pulmões, dificuldade de engolir ao passar da garganta e a pior de todas, de me dobrar a altura, passando pelos meus olhos. Com minhas últimas forças, que não eram muitas, pois já é sabido o meu medo, e com a sensação de ser sugado por aquela elipse de chão, agarrei-me como pude na grade previamente já aberta da janela e me puxei de volta para o quarto.
Aqui novamente poderia parar o tempo, entretanto peço ao leitor que considere a pausa anterior que em muito não difere desta nova. Pois bem, novamente voltei ao chão do quarto e novamente bati com as costas na mala. Desta vez me levantei esbravejando com Deus e o mundo, chutei com toda força a mala, que pouco se mexeu, porém me causou uma imensa dor nos pés que me fez esbravejar com Deus e o mundo um pouco mais. Sabendo que não conseguiria ver o céu decidi abrir a mala, e para isso tive a brilhante idéia. Na falta da luz solar que usufruamos da luz da modernidade. Acendi a lâmpada no interruptor, todavia o quarto não se quis iluminar. Olhei naturalmente para o teto e percebi que o bocal onde deveríamos achar a lâmpada se encontrava vazio. Esbravejando um pouco mais sentei na poltrona. Respirei fundo e decidi tomar coragem em levantar o toldo. Afinal existia um homem naquele lugar, e esse homem era eu. Levantei-me e respirando fundo lembrei da sensação de vertigem, que fez minhas pernas tremerem e me colocou novamente sentado naquela poltrona.
O celular tocou. Era o alarme me avisando que chegara a hora. Geralmente o tempo passa mais devagar, mas hoje estou tão entretido em conversar comigo mesmo que nem o senti passar. É uma loucura ficar horas esperando para fazer o que se tem de fazer sem fazer exatamente nada. Não sou de ficar muito tempo parado, uns amigos haviam me indicado palavras cruzadas. Eu até que tentei, mas no final acabo não terminado nem a primeira página e adormecendo. Abri a maleta e comecei a me preparar, eles já iam passar por aquela rua e eu tinha de estar pronto para eles. Fechei a cortina e por uma fresta observava enquanto de dentro da mala tirava todo material que precisaria para o serviço. Eu tinha de ser preciso, só tinha uma chance em cada trabalho, um erro e se punha tudo a perder, meses jogados fora. E no fim acabava se espalhando. Todos ficam sabendo da sua falha.
Com tudo do que precisava em cima do criado mudo voltei a observar da janela a rua. Estava pronto, mirava os pedestres e falava sozinho para me aquecer. Como já disse, quando o serviço desse as caras eu só haveria de ter uma chance. Uma única chance. Enquanto fitava da janela alguém bateu à porta. Quem poderia ser? Peguei uma portátil e fui conferir no olho mágico. Enquanto me dirigia para a porta apertava contra meus dedos o frio metal da portátil, estava nervoso, não poderia perder este trabalho, e esta pessoa na porta colocara tudo a perder. E se eles passassem pela janela e eu não os visse? Hesitei no meio do caminho da janela à porta. Decidi voltar a janela e aguardar, fingiria que não havia ninguém. Entretanto enquanto voltava a posição de onde estava pisei em um taco solto, que fez tal barulho que imaginei, se lá fora, eles ou ele, ou ela no que não sei ao certo, teriam ouvido. Fiquei parado em silencio.
Voltaram a bater à porta e desta vez me chamaram pelo nome, será que era uma emboscada? Nesse ramo muitas vezes já tentaram me passar a perna e se hoje estou aqui é por ter conseguido escapar a todas as tentativas. Aproximei-me da porta e olhei por dentro do olho mágico. Eram eles. O serviço me batia à porta, mais como saberiam, não foi assim que me informaram, eu os esperava na janela. E agora, estão à porta, e o pior, sabem o meu nome, corri até o criado mudo e recoloquei todo material que havia retirado da maleta, e fechando-a apoiei na parede. Arrumei-me e com a portátil na mão abri a porta.
-Boa tarde, viemos ver o apartamento.
-Boa tarde. Por favor, podem entrar.
-Eu sei que havíamos combinado no hall dos elevadores, mas o porteiro nos disse que o senhor já havia subido então preferimos poupar-lhe o trabalho de descer.
-Não, tudo bem. Eu trouxe os papéis, estão dentro da pasta, se lhes interessar o apartamento, fechamos hoje mesmo.
-Claro. Bonita caneta, onde comprou?
Apartamento vendido. Mais um breve dia na perigosa vida de um agente imobiliário.


Fim

Imagem de Thomas P. Anschutz

domingo, 21 de dezembro de 2008

Na janela – 1/2


Sentado em uma poltrona observo a janela. Numa mão seguro um livro e na outra uma xícara de café com um dedo de whisky. A janela é extremamente feia. Os raios luminosos não atingem diretamente meus olhos, são bloqueados primeiro por um toldo e em seguida por uma grade fechada. Coloco o livro e a xícara, já vazia, em cima do criado mudo e vou até a cozinha pegar a chave da grade. Ela está presa por dois cadeados, cada qual em um lugar distinto, o mais alto me obrigado a pegar uma cadeira. Sua altura me é superior do que a da ponta dos dedos, não me permitindo abri-lo sem auxílio. Consigo remover os dois cadeados e abro a grade. Entretanto me arrependo dessa ação no instante seguinte, já que ela, a grade, faz um barulho assaz incomodo aos meus ouvidos. Todavia sabia que mais faltava para lhe retornar a mesma posição do que para terminar-lhe de abrir. Optei por deixá-la como estava. Aquela vista que eu tanto almejava era inteiramente necessária ao que o meu trabalho me propunha. Ainda teria de esperar por algumas horas até avistar o alvo, até lá tinha de preparar o terreno.

Passei meu corpo pela fresta que lhe havia aberto e tentei ver o céu. Não consegui ver nem o mais distante. Havia me esquecido do toldo que ainda me impedia a visão. Era um toldo vermelho, amarelado pelo tempo nas pontas. De extremo mau gosto, assim como a janela. A corda para levantá-lo estava presa na grade. Eu a desamarrei com toda a calma do mundo, e quando fui puxá-la para que o levantasse fiquei a imaginar como não seria legal se fosse automático, quem sabe pelo som da voz, simplesmente falasse “levante” e ele se levantasse. Mas não era assim, eu tentei, juro que tentei, mas ele não se levantou. Então, sem outra opção, depois de desamarrar a corda, eu a puxei e o toldo nem se mexeu. Com um pé na parede fiz força suficiente para mover o mundo. Dificuldades que temos de passar para simplesmente olhar o céu. Ledo engano. Aqueles que acham que para olharmos o céu temos que, de forma natural, inclinarmos a cabeça em pêndulo para trás, no que devemos formar, mais ou menos, e falo como leigo, um ângulo de uns 60 graus, cabeça-corpo, se enganam. Olhar o céu se faz uma questão muito mais metafísica, e os metafísicos hão de concordar. Deixando a metafísica e voltando a corda, e eu estava puxando-a, com toda a força, até que finalmente o toldo se mexeu. Deve ter mexido uns cinco centímetros, até o factível som que a corda fez. Um estalar que justificava para mim sua recente leveza daquele instante, e demonstrava por causa e efeito seu arrebentar, e com ela eu me vi em queda, rumo certeiro até o chão. A queda deve ter levado mais ou menos dois segundos, mas sendo eu o dono deste conto posso malear o tempo de forma a fazê-lo passar horas em segundos ou segundos em horas.

Assim sendo, a queda demorou é verdade, e enquanto caio observemos a corda. Os fios do interior da corda vão se partindo lentamente até que possamos ver no exterior dela o seu último suspiro de tensão. E o toldo, que como disse, deve ter se mexido uns cinco centímetros se não me engano. São exatamente cinco centímetros, como o havia dito antes percebo agora a olho nu e lento. Muito bem, agora nos concentremos na minha queda, que por hora, ou melhor, por segundo, é a coisa mais importante nesses milésimos que transformei em minutos. Observem meus músculos, todos contraídos, e de um instante a outro, no arrebentar da corda, todos novamente se relaxam. Minha cara que era de esforço agora passa a ser de espanto, a queda me leva em linha retilínea de encontro a uma caixa de papelão. O que será que há nessa caixa? Meu corpo que cai lentamente sobre ela vai amassando o papelão a espera de um material que lhe resista à pele, o que a princípio o é o chão. Entretanto, antes que o chão lhe chegue, minha pele se depara com uma outra caixa que escondida dentro da primeira não me era percebida até então. A caixa de dentro, bem mais dura, toda de metal, acaba por me ferir a pele, contudo nada que a faça rasgar. Vocês conseguirão ver, se prestarem atenção, que a pele em sua elasticidade se interioriza no próprio corpo, mas sem se romper. Com o meu tombamento para a esquerda, ela, a pele, vai novamente expulsando a caixa, que anteriormente tentara feri-la. Nesta luta sairá a pele campeã.

Continua...


Imagem de Gustave Caillebotte

domingo, 14 de dezembro de 2008

" "


Silencio,...

















...

Imagem de Henry Fuseli

domingo, 7 de dezembro de 2008

Tão perto, e ainda tão longe esta


“Tão perto, e ainda tão longe esta...”

Você não vê agrade que nos separa. É a grade inescrupulosa do destino. Quem consciente da pequeneza humana teria a coragem de dizer que podemos ultrapassar essa grade. Nos vemos por entre as frestas, nos tocamos na ponta dos dedos. Nossas palavras são claras e distintas e isso é o mais frustrante, pois sabemos o quão perto estamos.

(...)

Não conhecemos o longo gradeado que nos separa. Temos medo de ir procurar uma passagem pela grade, quem sabe até mesmo um portão no destino, e não encontrando não nos encontrarmos mais também. Esse comodismo nos assola. Eu pensei em pular a grade, cavar o chão, quebrar o muro do destino. Você ficou receosa da punição, mais uma vez ficou com medo da eterna separação.

(...)

Começo a desconfiar que você não gosta realmente de mim. E isso nos afasta cada vez mais. Quando você percebe que já não te freqüento com tanta periodicidade tenta pular a grade. Consegue. E do outro lado me vê com um outro alguém. Si magoa e volta pro seu lado. Quando venho te visitar age naturalmente como se nada tivesse acontecido. Mi prefere distante a idéia de um dia não mais ter. É ai que você erra. Eu queria ti ter por segundos e lembrar o resto da vida o quanto foi bom.

(...)

Você é bicho escaldado, se me aproximo demais você foge, se me aproximo de menos você também foge. E nessa tênue linha vou te perdendo tenuamente até um dia não mais te querer. E você triste virar pra mim e falar que nunca quis me querer.

“Tão perto, e ainda tão longe esta...”


Imagem de William-Adolphe Bouguereau

domingo, 30 de novembro de 2008

Curtas


Só. Somente só sei o que em mim falta saber. Não temo a solidão, apenas não gosto que me tirem dela sem eu pedir ou que a ponham em mim seu eu querer. Só; projeto o futuro, idealizo o passado e amargo o presente. Acompanhado; projeto o passado, idealizo o presente e amargo o futuro.
As flores que a dias navegavam comigo se transformaram em cactos por não terem mais o meu coração para fertilizar o colchão onde estavam plantadas. Um dia, enquanto dormia, aproveitaram o balanço da cama-barco e se arrastaram até mim. Alojaram-se então no buraco vazio onde antes batia o músculo do amor. Lá estando transformaram-se em um novo músculo. Depois de um tempo, me olhando no espelho d’água de uma noite de lua cheia descobri que cactos também florescem.

Uma cerveja.
Sou feliz com o pouco muito que tenho, mais mesmo assim ainda procuro o muito pouco que não tenho. A! ser humano o ser menos humano que se tem.

Três cervejas.
Sozinho o diabo veio me falar. Disse doce, disse pra eu lhe amar. Neguei o diabo pensando em transar, aceitei a dor pensando pecar. A! oceano profundo que vem me chamar. Quem sabe um dia vem a aceitar. Se no oceano parar saibam que vim a ficar.

Cinco cervejas.
Sabendo que falo escuto que ouço. A magrela corre pelo quatro enquanto a gordinha cisma em dormir.

Seis cervejas
Bebo para não lembrar de esquecer que esqueço de amar você.

Não ligo que digo que falo, se falo falo alto se digo digo baixo.

Nada faz sentido e eu nem queria que fizesse.

Imagem de Henner, Jean Jacques

domingo, 23 de novembro de 2008

Curtas


Ando, ando, ando. Na minha cabeça não estão as pedras do chão, nem as formigas que carregam folhas enormes, nem as fachas que sinalizam onde devo atravessar. Na minha cabeça esta você. A falta de te ver aumenta o meu querer ti ter. Ti ter não para mim, não como minha. Ti ter por breves instantes, por breves suspiros, doces palavras, poucas canduras. Simplesmente ti ter. Saber que você só pensa em mim naquele momento e ter a certeza que eu só penso em você. Ser seu, ser meu, ser nosso. Mais apenas por alguns instantes. Antes que a monotonia venha sentar-se conosco na mesa do bar. Antes que as pregas do tempo retirem o assunto, não de nossas palavras; por que estas jamais serão vazias, mais de nossos olhares. Antes que eu te chame por apelidos carinhosos, antes que nos conheçamos por inteiro em cada detalhe. É antes disso que ti desejo. É antes disso que quero estar com você.

E depois? Você me pergunta. Depois não sei. Agora quero o segundo, quero a chuva que cai, não a poça que se forma, quero o calor que aquece, não os raios que iluminam, quero sangue, não soro, quero guerra, não paz. Quero você, não o futuro.

---------------------------------------------------X

Esses breves instantes se tornaram verdade. O futuro se mostra sempre próximos daqueles que amam.

Levantou-se e andou até o lado onde ela estava sentada. Partia no mesmo sentido de quem ia ao banheiro, ela em nada desconfiou. Estancou de repente e ao lado dela se ajoelhou. Do bolso direito retirou uma caixinha que abriu e mostrou a ela. Ela abriu e lá tinha não um anel mais um bilhete. Onde estava escrito:

-Te amo, não sei até quando. Casa comigo e te amarei até último instante em que te amar.

Viveram felizes para sempre...

---------------------------------------------------X

Passou. Você passou. Não te quero mais.

Foram as últimas palavras que ela disse. Depois levantou, pegou o coração dele que estava no prato e pediu ao garçon que embrulhasse pra viagem. Guardo na bolsa para comer mais tarde. Ele, já vazio, não reclamou. Encontraram-se como amantes, se despediram como amigos, se odiaram como inimigos.

---------------------------------------------------X

Queria escrever uma historia de amor que desse certo. Porém preso pela primazia inconstante dos fatos. Me perdoe a falta de credibilidade na vida mas entenda que até o fim será muito mais que só despedida. Ame-me a cada segundo como se fosse o último, pois assim viveremos minutos infinitos.


Imagem de Julien Dupré

domingo, 16 de novembro de 2008

Curtas


Palavras não se encaixam,
acho que elas deveriam ao menos tentar,
raras vezes meus ditos saem de tal forma
ação palavra.

Verbo verborragia,
outros se saem como desejaria eu me sair
cantam em versos,
estancam palavras com a mesma beleza que a Lua cessa raios solares.
,
Estou confessando aqui as fraquezas de meu espírito,
tolhido tal qual árvores que não mais se ocupam de dar frutos,
orgulho perdido
urge o tempo de perde-lhe também os galhos.

Começo...
ojeriza...
meio...

Saber algo do qual não lhe é necessário
ao
ultraje do sábio;
de mais avante
avança a sabedoria
do trabalhador
esse sabe apenas o que lhe é necessário, e
se aprende algo que não o é passa a selo pois assim o é desejado.
.
.
.

Imagem de autor desconhecido

domingo, 9 de novembro de 2008

Do Continente até a Ilha


A minha cama se transformará em um barco e meu baú desaparecerá, muitos dias se passaram desde então. Eu havia me livrado de todas as minhas magoas e tristezas, porém também do mundo. Esse rio que me tirou do meu quarto e me levou para esse mar incerto me obrigou a me virar sozinho por muito tempo. Sem qualquer idéia de futuro. Não sabia onde estava e nem onde queria chegar. Simplesmente naveguei. Sabia que tinha de navegar, assim sendo, levantei a ponta do meu colchão, na proa do meu barco, e arranquei a primeira madeira do estrado. Pensei por alguns segundos que isso faria meu barco naufragar, entretanto nada ocorreu. A madeira me deu uma farpa no dedo indicador, não doeu, queria que tivesse doido. Com a madeira em mãos a finquei no próprio colchão e ergui de lá meu mastro.
Tirei o lençol do colchão e prendendo-o pelas pontas fiz uma bandeira. Mas não era uma bandeira o que eu queria, eu não queria ser achado eu queria navegar. Então arrancando mais uma madeira do estrado, a segunda no caso, fiz de minha bandeira uma vela e com ela naveguei. Por dias e noites. A segunda madeira não me deu nenhuma farpa mais a ela eu pedi. Vendo o quanto a desejava ela me concedeu o pedido. Agora os meus dois dedos indicadores tinham uma farpa. Eram pequenas, por isso não incomodavam. Conforme os dias se passaram, não foram muitos, mas não saberia precisá-los, nasceu do dedo indicador direito um cravo e do dedo indicador esquerdo uma rosa. Eu não soube o que fazer com eles ate que eles mesmos me contassem. Pediram que os plantasse na próxima ilha a que eu fosse aportar. Lhes falei que não pretendia aportar em nenhuma ilha, mais na verdade eu simplesmente nunca havia imaginado a possibilidade de vir a encontrar uma. Eles me pediram então para que lhes plantasse na popa do navio. Peguei meus dois travesseiros que lá estavam e fiz de vazo para as flores, de forma a deixar ainda um espaço para que de noite pudesse me recostar.
Realmente as flores estavam certas, e eu logo aportei em uma ilha. Não imaginem que a ilha onde me encontro agora é a primeira que avistei, pois não é. Conheci piratas e baleias, sereias e princesas, até dragões juro ter visto. Vi você e me vi também. Muitos foram bons comigo, de outros não gosto nem de lembrar. Vi o nascimento do dia e da noite, vi homens morrerem e homens nascerem. Conheci José que me acompanhou em parte do caminho. As flores sempre estiveram comigo, mesmo que ás vezes as tivesse distante. Conheci Helena que me roubou o coração. Conheci Josefina que o devolveu. E assim os dias e as noites se sucederam. Minha vela alçada aos céus me levou a muitos lugares, mas foi esta ilha que eu escolhi para mim. E é daqui que conto minha historia. Da qual não vejo qualquer relevância, dela não vejo surgir nobreza nem grandes amores. Vejo muito mais simplicidade, pecado e nostalgia. Si querem saber não vejo razão para que alguém leia o que escrevo. Mais eu escrevo, talvez porque queira lembrar e temo esquecer, talvez porque queira voltar a navegar e temo me perder. Não sei o motivo nem sei se quero sabê-lo. Até lá escrevo e vocês lêem, por que se não lessem não teriam como saber que cá escrevo, e eu não saberia onde é que me perco.

Imagem de Emil Nolde

domingo, 2 de novembro de 2008

A Ilha


Por um prefacio as avessas...

Eu tinha um baú. Onde guardava todas as minhas magoas e tristezas. Era um baú grande e antigo. Todo de madeira, com as partes que ligavam as tabuas que o formavam de ferro fundido. Se assemelhava muito a esses baús de piratas que vemos nos filmes americanos. Não sei se o baú era assim por que tinha de sê-lo ou se o era pela imaginação de criança que eu tinha na época que o encontrei. Ficava no meio do meu quarto, e eu nunca havia me dado conta dele, até minha primeira grande tristeza. Não me lembro ao certo qual foi, lembro-me apenas que ele assim me apareceu, e eu já sabia para que servia. Lá fui guardando tudo que eu não queria dentro de mim. Fui guardando e deixando, ele sempre lá, no meio do quarto trancado com uma chave de ouro que eu levava em meu peito. Um dia jurei ter visto minha mãe tropeçar nele, ela disse que foi o tapete, mais eu acho que ela viu o baú, só não queria abri-lo.

Os anos foram passando e os objetos dentro do meu baú aumentando. Um dia tive outra grande magoa, corri pro meu baú, abri e lá coloquei-la. Porem o baú não queria mais fechar. Estava muito cheio e, não sei se vocês sabem, se não, saberão agora que magoas e tristezas não ocupam o mesmo lugar e nem podem ser prensadas, são duras como diamantes e ásperas como pedras. Primeiro pensei em quebrá-las, mais não tinha força. Decidi então que procuraria por uma das pequenas e a tiraria do baú levando a comigo. Comecei a esvaziar o baú, mas o reavivamento destas más lembranças me trouxe lagrimas nos olhos. Tentei guardá-las mais eram muitas e eu já não podia mais me conter. Chorei. Por dias e noites eu chorei.

Após muitos dias e muitas noites, eu em cima da minha cama, que havia se transformado em um barco, percebi que o baú já não estava mais lá. Nem o baú, nem minhas magoas, nem minhas tristezas. Tudo havia ido embora junto das minhas lagrimas. Entretanto minhas lagrimas levaram consigo muito mais do que isto. Levaram o mundo inteiro. Sentindo um tranco no meu barco-cama olhei para trás e vi uma ilha. Pequena e bonita. Muito simples e eu diria até meio simples demais. No meio da ilha encontrei cadernos e canetas nos quais escrevo essa história. Nos quais vocês lêem minhas palavras e interpretam meus signos. Assim surgiu a minha ilha. Mais ainda muito mais tenho para contar-lhes dela. Não que interessem a vocês saberem ou a mim contar. Mais algo, nesse infindo mar salgado nos une. Ainda não sei o que é, e não sei se um dia saberei. Mais até lá nada nos impede de continuar.


Imagem autor desconhecido

domingo, 26 de outubro de 2008

Coração Partido


Pequeno, muito pequeno. O homem nunca será grande o suficiente a ponto de não temer a si mesmo.

Vou ficar aqui. Parado. No escuro. Não quero me ver e nem que ninguém me veja. Em silencio posso ouvir as batidas secas do meu coração. Sentado no canto começo a chorar, só que eu não quero. Não quero mais. Grito, minha cara se deforma, o grito ecoa em minha cabeça. Ponho as mãos nela enquanto puxo meus cabelos. Com o rosto molhado, boca aberta, mãos na cabeça, grito, entretanto não sai nenhuma palavra da minha boca, na verdade a única coisa que realmente expresso é um leve ganido que mais se assemelha a um suspiro. Nesse instante sinto como se meu peito fosse explodir e com ele todo o meu corpo. Mas não é isso que acontece. A pressão que sentia no meu corpo na verdade era o meu coração que escalava meu peito para ver o que estava acontecendo do lado de fora.
Ele sai pela minha boca e me olha, como estou em um canto escuro não me vê. Corre esbarrando nos moveis. Procura o interruptor. Sabe que do lado da porta tem um, e sabe também que é muito pequeno pra alcançá-lo. Vai tateando pelo cômodo, que não é muito grande, até achar uma cadeira. Com toda força, ele, tão pequenino, empurra a cadeira até a porta. Coitado, ainda na esperança de me encontrar se estica todo, e com a ponta do dedo com o corpo totalmente esticado se aproxima do interruptor. Entretanto recua ao ouvir o barulho de chave na porta. Tenta descer do banco antes que a porta o derrube. A porta se abre, ele se joga na esperança de se salvar, porém o banco sucede por se fazer cair com peso encima do seu frágil corpo.


Você entra e acende a luz. Avista-me no canto, aos prantos. Preocupada arregala os olhos e me pergunta o que ouve. Eu, com os olhos vermelhos e quase sem lagrimas olho no fundo dos seus e sem dizer nada te dou um tiro na cabeça. Eu ainda te amava e não queria que você sofresse. Eu, eu não, eu vou sofrer por que amo a ti e ao mundo inteiro.

Imagem de Rafael Sanzio

domingo, 19 de outubro de 2008

Telefonema


Sozinho.

Trim...Trim...Trim...

É o mundo que me chama. Não vou atender.

A secretaria-eletrônica liga, Você ligou para o numero 27242020 no momento não posso atendê-lo deixe o seu recado após o bip ou tente mais tarde.

E lá vem o bip.

Mais a voz não prossegue. Parece estar no silencio a espreita de uma resposta, ou quem sabe esteja ainda aproveitando a curta frase onde por poucos segundos fantasiara minha imagem. Travesti da memória, imagem que lembra. Pura imagem, mas com realidade própria. A imagem que lembra travestindo não é a mesma que simplesmente lembra. Diferentemente da segunda a primeira fantasia, cria. Dela surgem cheiros sons materialidade, tão reais quanto a realidade, tão reais que quando você para de lembrar simplesmente parece ter ocorrido, não apenas pra você mais para todos. Na segunda a imagem nos vem simplesmente como uma fotografia, como o numero decorado do celular ou da formula química da prova de amanhã.

Ela não me lembrava, me travestia, me tirava a força da minha ilha sem que de lá eu tenha saído. E de posse da minha imagem me fazia e refazia a seu querer, aos seus desejos. Dez minutos depois um suspiro e o telefone no gancho. A ligação terminara. Mais eu, para ela, já era indiferente naquele relacionamento, ela tinha de mim uma imagem, com cheiros, sons, e materialidade, eu era apenas um problema, eu era apenas uma pedra da qual ela tinha que se livrar. Por que se o leitor acha que travestir a imagem de uma pessoa é algo triste, enganasse. É o que todos fazemos quando pensamos realmente conhecer uma pessoa, ou quando achamos que mais do que ninguém, mais do que ela mesma temos o direito, este de qualquer espécie, sobre aquela pessoa.

Porém, o problema mais serio desse travestimento é a própria pessoa que foi fôrma para a imagem, porque só esta pode frente a sua imagem travestida se despir. A imagem que se despe se torna nada, ela só é em quanto imagem. A pessoa que se despe, muda frente ao outro e isso incomoda profundamente o artesão, que com tanto carinho tinha, por si só, cultivado aquele fantasma.

Sozinho.

Trim...Trim...Trim...

É o mundo que me chama, pela quinta vez.

-Alo...

-...

-Alo...

-Oi...

-O que você quer, por que tanto liga...

-Eu te amo...

-Eu não te amo e nunca te amei, entenda isso e me respeite. Destrua tudo o que construiu sobre mim e refaça seu edifício, se mesmo assim ainda gostar de mim me respeite. É o mínimo que pode fazer, pare de colocar a sua vontade acima da minha e me respeite.

-Tum...Tum...Tum...

No dia seguinte.

Trim...Trim...Trim...

Jamais entenderei as pessoas.


Imagem da Escola do Realismo Socialista

domingo, 12 de outubro de 2008

Vazio


(...)

(...)

Nem tudo que digo falo por palavras.

Cada segundo, cada instante, sempre novo, nunca o mesmo. Me peça coisas plausíveis. Não me insira nos comuns. Sua intensidade me sufoca. Nunca imaginei que gostaria tanto de ser sufocado. Durma comigo uma vez na sua vida. Pois saberá que o que vê durante o dia não muda com as estações. Quando chorar me diga, pois não quero que chores. Si choras por mim, não me desejes mais. O tempo passa. As palavras não fazem mais sentido algum. Não expressão mais o que eu sinto. Me abrace, se sufoque. Se não sabe o que eu sinto é porque nem mais meus atos fazem sentido. Mais isso, isso, isso, i...s...s...o eu não posso aceitar.

Silencio
Olhar
Lagrima
Dor

Ilha minha, só minha. Só nela minhas palavras vão sempre fazer sentido. Pois nela, na minha ilha, só eu é que sinto.

Confia.
Pode confiar naquilo que não vê? Pode confiar no oposto do que sentes? Acho que não. Mais não tenho a resposta definitiva.

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Chegou em casa. Tirou as chaves do bolso. Abriu a porta que rangia. Pegou o telefone e ligou.
Com a roupa que ainda fedia a cigarro sentada na cama não pode entender como confiar tanto em si e duvida daquele que lhe dava sentido. Desligou o telefone. Ninguém lhe atendia. Em casa era pura duvida. Antes, quando ainda na rua, pura certeza. Mais uma vez pegou o telefone. Nada. Três. Quatro. Cinco.

Maria -Alo!
Antonio -Oi, tudo bem.
Maria -Não.
Antonio -Porque?
Maria -Porque você não atendeu.
Antonio -Desculpa eu não havia sentido o celular vibrando.
Maria -Porque você não me atendeu?
Antonio -Porque eu não ouvi o celular tocando.
Maria -Estava preocupada, porque não me atendeu?
Antonio -Simplesmente não tinha visto.
Maria -Estou chateada com você.
Antonio -Eu sei.
Maria -Sabe porque?
Antonio -Sim.
Maria -Porque?
Antonio -Porque me ama.

Em silencio Maria sorriu. Aquilo por alguns segundos respondeu todas as suas duvidas, todas as suas aflições. Afinal ele poderia não ter escutado o telefone, só isso.

Antonio –E tem mais.
Maria –Tem?
Antonio –Eu também te amo.
Maria –Boa noite.
Antonio –Boa noite.

Dormiu tranqüila, serena como a noite enluarada que Antonio via da rua.

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Até quando as palavras vão ser tão vazias? Ou será que vazias são as pessoas que as escutam? Acho que não. Mais não tenho a resposta definitiva.

Vazio.
Cheio.

Imagem de Alma-Tadema, Sir Lawrence

domingo, 5 de outubro de 2008

Desejo


- É bom ver você aqui...

- Eu não preciso de você...

- Mas eu preciso de você...

- Não me importo...

- É isso, só isso? Assim que termina...?

- Sim.

A porta se fecha. Num movimento seco, porém contido, Maria se vira e vai embora. Do outro lado da porta Matheus desaba. Senta e chora. Um choro incontrolável, inexplicável, inexperiente. Duas semanas depois...

- Oi...

- Oi...

(Silêncio)

- Eu preciso de você...

- Não quero saber...

Do outro lado da linha Maria bate o telefone. Com o telefone ainda na mão Matheus desaba. Senta e chora. Um choro incontrolável, inexplicável, entretanto já experiente. Duas semanas depois...

- É bom ver você aqui...

- Eu não preciso de você...

- Mas eu preciso de você...

- Não me importo...

- É isso, só isso? Assim que termina...?

- Sim.

A porta se fecha. Num movimento seco, porém contido, Matheus se vira e vai embora. Do outro lado da porta Maria desaba. Senta e chora. Um choro incontrolável, inexplicável, inexperiente. Duas semanas depois...

- Oi...

- Oi...

(Silêncio)

- Eu preciso de você...

- Não quero saber...

Do outro lado da linha Matheus bate o telefone. Com o telefone ainda na mão Maria desaba. Senta e chora. Um choro incontrolável, inexplicável, entretanto já experiente. Duas semanas depois...

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O desejo incontrolável de se estar com alguém só surge na perda da necessidade desse alguém de estar contigo. Nessa linha amigável apuramos nossos sentidos em busca de desilusões que nos apreendam na falta que o outro faz dentro de nós. O outro, parte de nós, tão seu, na distancia perfeita do não precisar de mim.

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- Saia.

- Porque?

- Porque hoje preciso de você...

- E eu de você...

Fizeram sexo por duas semanas, nunca tão próximos, nunca tão distantes.

Cada gozo um minuto,

de pura intensidade,

de pura necessidade,

de saber que não precisão,

ao mesmo tempo,

um do outro

e mesmo assim se desejam.


Imagem de Balthus

domingo, 28 de setembro de 2008

Direito a Existência

Levantou-se. Com os olhos ainda marejados andou até o banheiro. Jogou um pouco de água no rosto; se olhou no espelho. Sua cara ainda amassada da tarde bem dormida que levara refletia na imagem que via diante de si. Ajeitou-se, escovou sua mandíbula, colocou suas lentes de contacto. Não se considerava feio, mais sabia que naquele quarteirão existiam muitos outros bem mais atraentes que ele. De qualquer forma essa noite arrumaria uma parceira. Já estava na hora de apresentar alguém a família. Fazia oito meses que não se aproximava de uma fêmea, e isso era quase uma vida para ele. Não tinha tempo a perder. Os mais jovens da região se reuniriam hoje numa espécie de praça de alimentação, ele, que como eu disse não era feio; via nessa reunião a grande chance de falar com Vânia. Sua vizinha, que nas horas vagas era a paixão da sua vida.
Depois de uma hora se arrumando, totalmente preparado, lembrou-se que não havia passado no banco no dia anterior. Sabia que isso significava pedir dinheiro pros seus pais, o que significava aborrecimento, o que significava que preferia ficar em casa. Entretanto, ao se sentar na cama e abrir a carteira, viu a foto de Vânia, o que fez com que ele, novamente afoito, se penalizasse perante seus pais e fosse lhes pedir o dinheiro. Como previu, se aborreceu. Porém, olhou novamente para a foto dentro da carteira e novamente se empolgou em sair. A noite já se arrefecia, no chão a lua brilhava cheia, de cima do céu por entre a janela. Ele nunca passara pela porta. Sempre vivera dentro da casa, entre paredes.
Nunca falara a ninguém, mais seu grande sonho sempre foi tocar o chão de terra batida, por entre a grama úmida, depois do sereno da noite, ao amanhecer. Que idiota era ele com seus tolos sonhos. Em pensar que um dia aquele que nasceu pra viver no lixo vai subir a majestade. Que idiota era ele com seus tolos sonhos. Seu pensamento foi subitamente interrompido por um grito. Passado o espanto reconheceu Max que o chamava já havia algum tempo. Se despediu de seus pais e saiu. Tinha uma grande noite de conquistas pela frente. Ele até pensou, quem sabe, se seu sonhos não fossem tão solitários talvez não fossem tão tolos. Quem saberia o que Vânia pensava deles. Abriu um sorriso no rosto ao pensar na hipótese de que Vânia poderia acompanhá-lo em seus devaneios. E quando interpelado por Max do porque sorria este mesmo lhe respondeu, “Vânia”. Um pouco encabulado concordou com a cabeça. Foram andando até o ponto de encontro, que não era muito longe de onde moravam.


No caminho, o pior aconteceu. De um momento a outro, a escuridão virou luz, o silencio grito, a felicidade desespero, a lentidão correria. A luz se acendera, uma mulher gritava enquanto corria para o armário em busca de alguma coisa. Ele e mais três amigos, contando Max, não sabiam o que fazer, não sabiam o que gritava a mulher. Simplesmente pararam. A mulher diminuiu os gritos há chegada de um homem que rapidamente desapareceu, retornando em seguida com um chinelo na mão. Eles, ainda parados, sabiam o que estava prestes a acontecer. Mas não sabiam o porque. Estavam parados, quase fora da vista daqueles dois, mais eles pareciam não poder deixá-los. Aqueles dois em pé, por sua vez os perseguiam, como monstros que não merecem, ou não possuem, o valor da existência.


Minha narração poderia continuar em Max que morreria dali a duas horas, vale ressaltar que são duas horas de pura agonia, provocada por uma grande dose de veneno no corpo. Entretanto prefiro me encerrar com ele, que de um golpe teve todo seu corpo esmagado. Erguido, com uma total alienação quanto a nobreza de sua existência, relacionado a um asco que escorria pelo chinelo foi lentamente esfregado nas bordas da lata de lixo sem o menor pudor, sem a menor cerimônia. Quanto a dignidade que seus sonhos lhe patenteavam aquele ser que lhe privara da vida parecia ignorá-los.


E para que vocês não se esqueçam que ele realmente existiu digo-lhes seu nome. Morreu hoje, Adrian Troccoli, uma barata também.


Que idiota era ele com seus tolos sonhos.

Imagem de Caravaggio

domingo, 21 de setembro de 2008

Curtas


Cansei.

Minha pele que ardia não arde mais.

Minha fome que doía não me incomoda mais.

Preciso dormir.

E não acordar mais.

Tudo virará lembrança.

E na desilusão de um sonho dormirei desiludidamente feliz.

Não me acompanhe.

Levarei meus livros, e lá me deitarei.

Não quero mais nada.

(...)

Mesmo assim, se quiser, visite-me. Mas vá embora antes que eu me canse, ou antes que você ache que pode substituir qualquer uma das coisas acima.

(...)

Coisas são constantes, pessoas não.

Que triste vida leva Adrian em sua ilha...


Imagem de Goya, Francisco

domingo, 14 de setembro de 2008

Curtas


Pensei em escrever sobre a escolha, sobre o engajamento e, principalmente, sobre a liberdade. Porém ao refletir um pouco mais tarde, não sei se por causa da febre que assola esse corpo, não sei se pela ardência que queima meu rosto, decidi pela via poética.
Sim isso é poesia, mesmo que em prosa, e se não for não vou lá me preucupar com nomeações. Se não é poesia é no mínimo poético, é no mínimo libertador. Mesmo que o homem esteja condenado a ser livre, condenado a escolher, condenado a reiterar escolhas para que elas continuem escolhas e não virem passado, mesmo assim escreverei sobre a beleza da liberdade de imaginar.
Quem quizer procurar liberdade, escolha, engajamento deve se dirigir a reitoria da UERJ pois lá se encontraram todos esse elementos...
Tendo dito, libero meu imaginar em oposição a minha razão.
No juizado do conhecimento a razão foi acusada, por ela mesma, de falsidade. Falsidade de vender algo do qual não possui. O julgamento foi marcado. E como defesa, acusação, e júri eram as mesmas pessoas ninguém faltou. Naquele domingo a razão ia a julgamento. A condenação da razão parecia impossível. Qualquer crime e pena que se dite a razão estava cercada. Condenar-se, a razão mesma, era condenar a todos naquele tribunal. Então Kant deu a voz de prisão: “já que não podemos condenar nós mesmos limitemos a razão...”. Desde então venho tendo pesadelos, minha razão vendo minha imaginação voar, se pergunta se não seria melhor ter sido condenada a morte do que ficar eternamente nesta gaiola?
Mas no final das contas sou condenado mesmo a ser livre, por que quem dirá que não sou eu também imaginação...Minha própria liberdade de voar.

Imagem de Autor Desconhecido

domingo, 7 de setembro de 2008

Árvore da Vida


Procuro um livro. É um livro específico e bem difícil de se encontrar. Não sei se o é difícil de se encontrar porque o procuro, ou se o procuro porque é difícil de se encontrar. Afinal se não fosse difícil de se encontrar já o teria encontrado, logo já não mais o procuraria. Se o procurasse porque é difícil de se encontrar eu teria assim a probabilidade de jamais o encontrar, exatamente por ser difícil.
Assim percorro as livrarias do centro da cidade. Com o Sol na minha nuca e um peso em minhas costas. Minha busca é dispersa. Assim é, pra que eu não me enlouqueça, buscas secundarias aliviam a pressão da principal.
Vejo a vida dessa maneira. Busca infinita de significados, enraizadas por buscas secundarias de significantes. Que ciclo vicioso é a arvore da vida. Mesmo assim tão diversa, tão ambígua, contradições que não se contradizem, signos que nada representam. O fim de sua existência não se dá, não existe. Pois ela nunca o realizará. Quando morrer, e será breve, da morte nada levará, da mesma forma de que nada levou do seu nascimento.
No centro da cidade finalmente o encontro. O vejo de longe, lá está ele. O livro que tanto procurei, o tronco da minha árvore. Aperto o passo, tão firme e seguro quanto o do ônibus que vem em minha direção. Ouço a sua buzina, os pneus travando seus gomos no chão cantão e deixam suas marcas, como garras no asfalto.
Minha existência termina. Independentemente da realização ou não do meu encontro. Sou perfeito. Sou tudo o que podia ser. Não sou mais nem menos, sou perfeito, tal como uma pérola que se molda no ventre de uma ostra na mais imensa escuridão da qual pudesse ela lá moldar.
Sou finalmente tudo...

Imagem de William-Adolphe Bouguereau

domingo, 31 de agosto de 2008

Curtas


Na Sala

A janela me chama. O suicídio me aguarda. Vou sair e não volto mais.

- Para de falar. Porque não se cala? Engula sua saliva e engasgue. Morra. Engasgue e morra.

Um bem pra mim, é um bem pra todos. Será que posso me agüentar com esse peso as costas? Se não posso com ele, iremos morrer, eu e ele. Eu e o peso. Assim a minha queda será mais rápida, e quem sabe menos dolorida.

A janela me chama, o vôo me apraz. Minhas idéias me consomem. Não sou o que ainda posso ser, e eu posso ser o que quiser, como eu detesto isso. Vácuo orgânico, espírito distante. A janela me chama.

Como é lindo o entardecer.


Imagem de Salvador Dali; Nude on the Plain of Rosas, 1942

domingo, 24 de agosto de 2008

Terceira Parte – O Amor


Ensaio da Morte do Amor

Ainda vivo fugi. E pelo deserto andei umas 10 horas sem nada achar. Até que o fatídico aconteceu. Com o fim da gasolina, com fome e sede, o carro parou e eu adormeci.

Seria esse o meu fim...

Terceira Parte – O Amor

Quando sai do carro me dei conta que havia apenas torcido o pé, não o havia quebrado como pensara antes. Mesmo assim andar ainda era difícil, e isto me obrigou a parar de andar alguns metros após ter começado minha fatídica caminhada, não muito longe de onde abandonei meu carro. Alguns metros mais adiante eu caí.

Quando acordei percebi que estava sonhando, sabia que era um sonho pelas aberração que o formava. Eu. Um fundo branco. E Dinora. Quem é Dinora, vocês devem estar se perguntando. Bem, ela foi a única pessoa que me amou e mais tarde eu viria a descobrir que foi a única pessoa que eu amei. Ela morreu a sete semanas atrás. Fiquei sabendo através do jornal que lia em uma segunda-feira chuvosa, no dia do nosso aniversario do primeiro encontro. Coisa de casal apaixonado, só quem já esteve na mesma posição saberia explicar essa idéia de comemorar a primeira vez em que um casal sai junto. Memórias das roupas aos gestos, ela tinha tudo isso gravado na sua linda cabeça quando nos separamos. E isso já completava vinte anos. Não me perguntem porque me separei, já que foi uma iniciativa minha, pois nem eu sei ao certo. Eu queria ser livre. E achava que liberdade era não depender de ninguém e que ninguém dependesse de você. Mas isso nunca iria ocorrer.

Naquele sonho Dinora estava conforme eu a havia deixado, linda e com um sorriso que era só seu na face. Fumava um cigarro enquanto segurava um copo de vinho na mesma mão. A outra mão estava apoiada em uma cadeira que acabara de brotar ao seu lado naquele exato instante. Vestida com um comprido vestido vermelho e um sapato combinando. Não sei ao certo se combinava ou não, mas, como sempre eu lhe falava, tudo nela combinava. Ela largou da cadeira e começou a se aproximar de mim. Rebolava enquanto andava na minha direção, parecia que a qualquer momento poderia quebrar em dois, de tanto que rebolava. Não pude esconder minha excitação. Ela notando sorriu, eu notando que ela notara me envergonhei. Não por me reprimir, mas por não conseguir esconder o quanto ela ainda me dava prazer. De repente a cadeira que estava um pouco mais atrás dela desapareceu, e no mesmo instante em minha mão apareceu uma outra taça de vinho. Ela já bem próxima com sua mão esquerda me rodeou o braço, para que entrelaçados bebêssemos juntos. Bebi. Poucos segundos depois o chão, que não podíamos ver, apesar de senti-lo, desapareceu sobre meus pés. Eu e ela caímos. Tentei me agarrar a alguma coisa mais não havia nada. Olhando para Dinora e vendo o seu desespero e suas lagrimas, iguais as do dia em que nos separamos, tentei desesperadamente agarrá-la. Entretanto quanto mais me esforçava mais ela se afastava. Ela caia, no que eu supunha ser para baixo; a única direção possível para a queda, bem a minha frente, quando as suas costas eu vi o chão de paralelepípedos de uma rua. Uma rua qualquer, indiferente a sua existência familiar ou não, mas de uma existência capaz de nos machucar. A rua parecia engoli-la e eu nada pude fazer, apenas chorei. Dinora estava estatelada no chão da rua, eu ao seu lado chorava. Viu o que você fez, ouvi de uma voz.

Eu reconhecia aquela voz, todavia não sabia aquém poderia pertencer. Levantei meus olhos do corpo de Dinora e reconheci Alberti, que não mudara nada desde que deixei a cidade. Ele era meu velho amigo de infância, ele era o irmão de Dinora. E bem ao seu lado ajoelhado no chão, no lado contrario ao do corpo mas na mesma posição que a minha, agora estava Jorge, pai de Dinora. Vestia o que por tantos anos o vi usar, o uniforme policial. Eles bem na minha frente me xingavam, eu bem na frente deles chorava. Até que um silencio, rompeu o som das palavras, apenas lhes restando os gestos labiais que não pararam, só o som que essas palavras emitiriam normalmente se calou. E deitada no chão, ao redor de uma poça de sangue, que mais parecia uma aura, Dinora falou. “Por que me abandonou?”.

Eu lhe respondi. Disse que era jovem; que achava que tendo novas aventuras poderia voltar novamente pra ela; disse que não queria me prender a ninguém; disse que a amava mais que não a queria, pois naquele instante querer-lhe era magoá-la, disse-lhe tantas palavras...mas delas nenhum som saiu. E ela novamente me perguntou. “Por que me abandonou?”. E finalmente palavras saíram da minha boca, e eu lhe disse. “Por que não sabia que te amava, e quando descobri não sabia até quando te amaria...”. Ouvindo o som de minhas palavras não pude continuar pois ela assim me destruiu. “Eu só a você verdadeiramente amei, me tranquei do mundo, me tranquei de mim, e assim por vinte anos vivi. Quando, depois de vinte anos voltei para o mundo, ainda te amando, por outro enfim me apaixonei. Tendo esses vinte anos perdido e finalmente compreendido que o amor por você foi uma ilusão, e que pior foi uma ilusão só minha, eu me matei. Pois não queria me iludir, os anos que passei te amando não poderiam ser em vão. Então preferia morrer te amando a descobrir que nunca te amei de verdade”. Nesse instante eu já não chorava mais. Eu havia finalmente percebido ela não me amou, ela amou a esperança de que eu voltasse a lhe amar. E eu, covarde que sou, fugi da minha cidade natal, deixando tudo pra trás porque não tive coragem de dizer-lhe que não lhe amava mais. Ela, também covarde, se matou por não querer ver que eu não lhe amava, quando percebeu que seu amor se baseava na esperança que tinha de ser amada, não por mim, mais por alguém, já era tarde de mais.

Os homens a minha frente, seu pai e seu irmão, foram envelhecendo. O tempo que passou, deduzo cerca de vinte anos, fora transformando-os no caminhoneiro e no policial que eu vira a pouco no deserto. E aos poucos, conforme os homens envelheciam, Dinora sumia, e o fundo que era branco novamente voltava a paisagem do deserto. Os homens se definiam cada vez melhor, até, finalmente se igualarem as figuras que anteriormente me perseguiram. Um virou pro outro e disse: “parece que finalmente ele esta acordando”, e o outro respondeu: “já não era sem tempo”. Eles se agacharam a minha frente e me contaram o porque de Dinora ter se matado. Eu um pouco tonto lhes disse o que Dinora havia me contado, e não a simples idéia que eles tinha de que ela se matou por me amar. Alberti me revelou que havia se tornado caminhoneiro e que após a morte da irmã soube por um amigo em comum que eu havia largado o emprego e que começara a beber. Assim após me encontrar foi me drogando paulatinamente, até que eu desesperado, enfim viesse atrás daquela que sempre me amou. Em busca de uma resposta para morte do amor.

Pare de pensar, retroceda, ignore o que viu, viva do que sentiu.

Eu que procurei o amor por toda a parte, sendo induzido a isso ou não, finalmente havia-o encontrado. Não na palavra de Dinora que me largara por uma caminhoneiro, este por sua vez que pagou um policial corrupto para me afastar dela e de minha filha, me levando até a fronteira e me deixando a mercê da própria sorte. Após é claro me drogar visivelmente. Minha lucidez finalmente voltara. Enquanto abria os olhos, não da visão, mais sim do entendimento; da razão, pude ver; melhor perceber, a presença de dois coiotes que esperavam calmamente o meu suspiro final, para que assim, sem esforço aproveitassem da minha carne. Eu, sozinho, contava exatamente a mesma historia que lhes conto agora para esses dois animais, muito mais humanos do que todos esses que até aqui me trouxeram. Corruptos, corruptíveis. Eu em minha solidão, não sei se pela impressão tão imensa do deserto, se pela insolação, ou a proximidade da morte, percebi que a forma mais pura do amor é o amor próprio. Pensando isso me vi, em pé, de frente, no meio dos dois coiotes. Pisquei. E me vi sentado, me olhando em pé. O eu sentado pendeu a cabeça em direção ao chão. Eu me virei e andei. Não sei para onde, nem por que. Porém, uma coisa eu sabia, que eu me amava. E pensando isso o deserto não se estreitou, o Sol não se amenizou, e a idéia de que eu poderia morrer não sumiu. Entretanto eu estava mais forte, sabia que podia contar sempre com alguém, que sempre estaria –lá. Eu.

Hora do remédio Adrian...As folhas continuam caindo...

Na medida do possível, Fim.


Imagem de Autor Desconhecido

domingo, 17 de agosto de 2008

Segunda Parte – Alguém Me Persegue


Ensaio da Morte do Amor


Nada podendo fazer e com o dia amanhecendo nas minhas costas, só pude pegar o carro e voltar para casa, sabia que após uma boa noite de sono poderia voltar a investigar a morte do amor.

Segunda Parte – Alguém Me Persegue

Não cheguei a entrar em casa, acabei adormecendo nas escadas que davam para o meu quarto de hotel, numero 2121. Quando acordei minha vizinha me olhava com uma cara indescritivelmente horrorosa, trazia na cabeça uma toca de bolinhas que quando mexiam faziam um barulho insuportável. Perguntou se estava tudo bem comigo, falou bem mais do que isso, mas só pude compreender isto. Acenei que sim com a cabeça e me levantei, meu cérebro parecia pesar duas toneladas. No que devo ter ido me arrastando cheguei a porta do meu quarto, e com muita dificuldade acertei a fechadura e foi ai que percebi que a porta se encontrava aberta. Quando entrei as minhas coisas estavam todas reviradas. Ouvi um barulho e saquei da minha arma. É eu tinha uma arma. Estava mais pra uma relíquia da segunda guerra mundial, mas era uma arma. Corri até a cozinha e quando cheguei vi o que deveria ser a linda Cristal, minha gata de estimação, totalmente queimada dentro do forno de microondas que ainda girava. É alguém não queria que eu procurasse mais nada naquela cidade, e isso já havia custado a vida da Cristal, e como não possuo mais ninguém o próximo com certeza seria eu.

Fui até a delegacia dar parte do ocorrido. Me atenderam rispidamente não sei se pelo meu corte de cabelo ou se pelo vomitado em minha camisa, conclusão, falaram-me que iriam averiguar o apartamento e procurar na região, mas que provavelmente foi obra de alguns adolescentes sem ter o que fazer. Pedi para usar o banheiro, que ficava entre o balcão e as escadas que subiam para os escritórios dos policiais, salas de armazenamentos e tudo mais. Percebi que os policiais me olhavam de forma inquieta, atrás da minha orelha começava a saltitar uma pequena pulga. Fingi que ia ao banheiro e quando eles se distraíram subi as escadas, grande erro. Com a roupa e a aparência que eu estava só consegui ser enxotado da delegacia, por um policial que mais parecia um soldado neo-nazista do século XXII, e de ter a certeza que eles não investigariam meu caso.

Fui até a esquina onde ficava um pé-sujo, e onde também os distintivos paravam para tomar umas e outras. Conhecia a dona do tal pé-sujo, Natasha, já tínhamos feito sexo algumas vezes, nada de mais. Eu como sempre fiquei até o bar fechar e ela também, como de hábito, me chamou para subir. Ela que morava encima do próprio bar. Tomei um banho e transamos, ela me contou, depois da terceira vez que eu a havia feito gozar, que os policiais andavam falando de um cara que estava atrapalhando os seu negócios. Entre a quarta e o banho, esse final, de despedida, ela também me contou que os tiras estavam por dentro das apostas entorno da morte ou não do amor. O esquema começava a se encaixar. Tanto os policiais quanto os bandidos estavam por dentro, e se eu quisesse uma pista real teria de sair da cidade. Depois do meu banho derradeiro, dei-lhe um beijo e vesti as roupas do falecido marido de minha grande amante. Grande porém não gorda, Natasha devia ter mais ou menos um e noventa e os ombros mais largos que um nadador, seu marido falecera faziam dez anos. Eu o conheci, era um bom homem, só que bons homens morrem cedo. Só tinha um defeito, como se vestia mal o filho da puta. Das dez camisas que lhe restaram ao armário dez eram floridas, e as bermudas mais lhe pareciam sacos de batatas entre as pernas finas. É, bom homem, mal gosto. Despedi-me e parti para o interior, quem sabe lá encontraria o que procurava.

Fui até a estação próxima, mas não consegui pegar o trem, parece que havia ocorrido uma chacina e a polícia fechou o local para averiguar a situação. Eu sabia o que estava acontecendo. Eles não queriam que eu me aproximasse da verdade, e eles sabiam que eu estava no caminho certo. Determinado, e com alguns trocados no bolso passei no armazém de um amigo e pedi-lhe a caminhonete, prometendo-lhe devolvê-la em breve. Como agradecimento de sua boa vontade lhe dei meus trocados. Nesse mundo de hoje nada se é recebido de graça, nem mais a graça divina é zero oitocentos, ela agora custa, e custa caro. E nessa onda de dá lá toma cá me fez dar há sua filha uma carona. Era uma menina de 25 anos, cujo nome eu não ousei perguntar e por isso só a chamava pelo sobre nome do pai, Label, cujo corpo diferia totalmente do pai, ela igual a mãe possuía um corpo simplesmente sensacional. Como bom amigo que sempre fui prometi levá-la e de cuidar muito bem dela, e assim o fiz. Depois de uns cem kilometros em mais ou menos uma hora parei o carro no acostamento e começamos a nos beijar. Ela sabia o que fazia, não era mais aquela menininha que eu virá crescer. Entretanto essa lembrança me fez ligar o carro e ir embora. E a lembrança daqueles peitos pra fora da camisa me fez parar cem metros adiante e novamente pôr lhes a boca enquanto ela gemia. Fizemos tudo o que tínhamos direito, e até algumas coisas das quais não tínhamos direito também. Demoramo-nos umas duas horas, e que depois voltamos a estrada. Dez minutos depois já voltávamos ao acostamento. Demoramos seis horas em um caminho que se faria em situações normais de experiência, com temperatura e umidade do ar ambientes ideais, em duas horas e meia.

Deixei-a na cidade a qual havia prometido. Tenho de confessar o meu alivio, não sabia o quanto ainda poderia agüentar aquele fogo todo que a juventude confere a seres tão inocentes. A cidade era uma antes a que eu pretendia chegar, logo estava perto, porem, como estava cansado e já anoitecia resolvi ficar nessa cidade e procurei uma estalagem. Pro meu azar Label trabalhava lá. Assim não preciso nem lhes revelar o quanto difícil foi minha noite. Por sorte havia levado comigo o meu santo protetor. O santo contra qualquer falta de fé em milagres o santo Viagra. Na manhã seguinte nada descansado peguei minhas coisas, que se reduziam a chave do carro e cai novamente na estrada.

Em pouco tempo notei que estava sendo perseguido por uma caminhonete que não me largava de jeito nenhum. Fui o mais tosco possível, parando no acostamento e ela seguindo enfrente, entretanto um pouco mais a frente lá estava ela, parada a minha espera. Eu acelerei o carro para tentar despistar a caminhonete pela velocidade, quando, achando ter conseguido me propus a diminuir a velocidade, bem na minha frente avisto uma blitz policial. Eles me avistaram. O policial da frente levantou a mão em sinal para que eu diminui-se, de prontidão obedeci. De repente sinto uma forte batida na traseira do carro. Era a caminhonete que a essa altura me jogara a metros de distancia para fora da estrada, no que aquela altura do caminho era no meio de um deserto, e aquela altura da minha vida me fudeu todo. Quando pelo retrovisor olhei a caminhonete vi que o motorista conversava aos risos com o policial que me acenara tentei ligar o carro. Entretanto havia eu quebrado a minha perna direita, não podendo acelerá-lo na hora da ignição. Desesperadamente, e com uma dor insuportável, na medida em que eu ainda podia suportá-la, agarrei minha perna e a encostei no banco, permitindo que eu pudesse acelerar com minha perna direita. Olhando pelo retrovisor via a lenta aproximação do policial e do caminhoneiro que percebendo que eu havia ligado o carro e começava a andar correram para os seus respectivos carros. Enquanto corriam atiravam contra meu vidro traseiro. Ainda vivo fugi. E pelo deserto andei umas 10 horas sem nada achar. Até que o fatídico aconteceu. Com o fim da gasolina, com fome e sede, o carro parou e eu adormeci.

Seria esse o meu fim...

Continua...

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