domingo, 18 de maio de 2008

Desculpe-me


Acho que estou morto. Deitado na minha cama olho tudo de cima, você anda de um lado pro outro. Parece preocupada com alguma coisa, sai do quarto por alguns minutos, tento te seguir mais não consigo, parece que tenho que permanecer perto do meu próprio corpo, eu que nunca havia me afastado tanto dele ate então. Você voltou, me olhou por um instante e deitou-se novamente ao meu lado. Como gosto de me deitar ao seu lado, sentir seu corpo no meu, olhar-te enquanto dorme. Mas você não voltou a dormir, se aproximou e me falou algo ao pé do ouvido, eu tentei te responder, mais não estava ali naquele momento. Você então começou a chorar e me bater tentando fazer de tudo pra que eu me mexesse, mais o que você não percebia era que eu não estava mais ali, que eu mudara, que aquela casca já não me cabia mais, eu a rompi e sai. Você saltou da cama e pegou o telefone, eu berrava o seu nome mais você não me ouvia. Sentada num canto ligou pra alguém, uns quinze minutos depois dois homens chegaram e levaram meu corpo, eu no chão ao seu lado tentei ficar, mais eles me levaram também ao carregarem minha antiga casca, ao que parecia eu ainda não esta totalmente livre dela. Os dias foram passando e eu finalmente consegui me livrar, mas quando te procurei você nem olhava pra mim, parecia distante.

Os meses foram passando e você voltou pra casa. Quando você chegou eu não estava, mas assim que soube que você havia voltado larguei o que estava fazendo e fui com lagrimas nos olhos e um sorriso na cara novamente te ver, na esperança que você já pudesse me perceber. Quando cheguei você estava no mesmo canto que estava quando me levaram e eu ao te ver me aproximei e me sente do seu lado. Do seu lado te pedi desculpas, lhe disse que você não merecia nada disso do que estava passando e que com toda certeza a culpa era também minha, você esboçou um sorriso ainda olhando para frente e eu continuei. Disse que te amava e que esses dias só havia pensado em você, mas também lhe disse que eu não te pertencia e que de forma alguma você poderia tentar me controlar, que eu gostava sim, amava sim, que por mim eu e você seriamos até o fim de nossas vidas, entretanto também disse que eu seria muitos, seria vários, não me prenderia a afetos que me prendesse mais sim a afetos que me libertassem, que me fizessem alçar vôo e que me levassem para lugares muitos e distantes.

Você que naquele dia quando soube que eu não estava só a dormir contigo pegou-se de minha gravata predileta e enquanto eu dormia me sufocou até que eu não mais respirasse, você que enquanto andava de um lado pro outro do quarto se lembrava que quando comecei a dormir contigo dormia também com outras e você e elas sabiam, você que enquanto tomava banho lembrava que sempre que eu lhe dava lhe dava meu melhor e nunca havia pedido lhe nada alem de você como se apresentava e não como eu poderia querer que se apresentasse, você que ao se deitar do meu lado esqueceu-se de que me enforcou, lembrou-se de que me ama e de que estaria sempre ao meu lado e assim, aos prantos tentou me acordar. Você novamente começou a chorar, eu me levantei, com as dificuldades que o sufocamento me deixaram, abria a porta do quarto e saí, entretanto, antes, lhe deixei um bilhete encima da cômoda que ficava do seu lado da cama. “Não se preocupe, se precisar estou no sofá.”.

O que seve pra um

não serve pra todos,

sou muitos

em tão pouco.

Entre as mentiras

de mim mesmo,

e as verdades

do mundo lá fora

sigo a historia

de vários eus.

O tempo corre mais rápido

do que deveria,

e atrás dele

seguimos a trilha.


Imagem de Van Gogh

Gritado Por:

Ailatan Do Contrario - http://contrariandoocontra.blogspot.com/

Adrian Troccoli - http://criticareconstrutiva.blogspot.com/

3 comentários:

Natalia Vieira disse...

...sniff...

Vicky disse...

desculpe me,digo eu!
Afinal consigo ouvir seus personagens falarem com uma clareza assustadora,são lindos e adoravéis,brincam com realidade,continue!
=*

Mayara Bandeira disse...

prazer em conhecer vocês.