“Assim que se olharam, amaram-se; assim que se amaram, suspiraram; assim que suspiraram, perguntaram-se um ao outro o motivo; assim que descobriram o motivo, procuraram o remédio.”
William Shakespeare
Sentado dentro do aquário que lhe cabia na seção do departamento Antônio olhava atentamente para Cláudio. O amor que aquele sentia por este parecia incondicional. A repulsa que algo dentro dele gerava também. Como poderia ele gosta de outro homem...Como poderia aquele homem não sentir o que ele sente, como pode alguém ser tão amado sem retribuir. Na terça feira, na hora do almoço, sentaram-se os dois juntos. Carmem que sempre comia com os dois adoeceu e faltara, era chance de Antônio dizer aquilo que a dias dormia em sua garganta, arranhando toda noite em sintonia com as batidas do seu coração.
- Cláudio...
- O que?
- A cinco anos que nos conhecemos...já faz bastante tempo...
- É, quantas merdas nos já não fizemos juntos, dês dos tempos de faculdade...
- Eu sempre tive varias namoradas, você sempre foi meio lerdo com isso...
- (Risos) Eu nunca gostei de ficar preso a ninguém...
- Cláudio...
- Que é?
- Acho que te amo...
Cláudio levantou da mesa e saiu andando. Nunca mas falou mais do bom dia com Antônio novamente. Chateado com a situação, mas ciente de seus sentimentos Antônio se mudou, foi morar em outra cidade, Cláudio nunca mais teve noticia do amigo.
Cláudio continua pulando de relacionamento em relacionamento e todas as meninas que leva pra casa lhe perguntam quem é o bonito rapaz da foto presa no espelho da cômoda...
Contra mentir para si mesmo o remédio ainda não foi encontrado.
(Não esperem muito do texto, só passando o tempo. Espero em 2010 conseguir escrever uma história continua)
“Eu sinto. Sinto algo de ruim que se aproxima, uma sombra que nos encobre. É a sobra do futuro, futuro incerto. Deixe me ir, eu quero ir primeiro, porra me esperem seus bandos de filhos da puta, me esperem passar pela linha de chegada, não custa nada me deixar ganhar ao menos uma vez. Não quero ganhar mais nada. Só quero ser o primeiro. Quando eu passar vocês me sigam, eu não temo o fim o que eu temo é ter de trilhar o caminho sem vocês. Por que haveria eu de querer trilhar essa merda de caminho, pedregoso, incerto, hora curvo hora reto. Eu sei que a felicidade é passageira e que a dor que não passa, ela esta nos objetos, nas lembranças, em tudo.
Por isso peço, melhor, lhes imploro, deixe me chegar em primeiro lugar.”
“Fraco de merda, choras quando mais precisam de ti, ri quando ninguém mais ri. Morra ou adapte-se.”
“Nada irá acontecer com aquele que com Deus for um só.”
“As mascaras não servem pra esconder, elas transformam o que vestem.”
“Algo pra se esquecer.”
Só para constar, estou na tentativa de encontrar um personagem central pra minhas histórias por isso o texto fora de época e por isso da falta de textos.
Um silêncio momentâneo foi rompido pela profunda respiração de Miro que ofegava e suava enquanto apontava o cano de um 38 preto para o próprio queixo. De longe Carla chorava incontrolavelmente, apenas coberta por um fino lençol de cama que descuidadamente mostrava-lhe parte do seio esquerdo. A três palmos de distancia dela Pedro observava boquiaberto e nu toda aquela cena. Todos estavam de pé e dispostos como em roda, o silêncio durou por cinco segundos que passaram como se fossem uma hora. Uma lagrima azeda correu pelo rosto de miro e desceu pela lateral da pistola como que a alisando. O gatilho estalou com o polegar de Miro que o colocava pra traz. Como que de forma natural Pedro deu um passo a frente e estendeu lentamente a mão em direção a Miro.
Um tiro de pistola, um grito de mulher e um corpo estendido no chão. Foi o que se deu nos cinco segundos seguintes.
Miro olhava quase sem piscar para a mulher a sua frente. Cega de um olho, com apetrechos que lhe pareciam pesar o corpo, a mulher lhe passava uma imagem, apesar de tranqüila, angustiante. “E então?” perguntou Miro. A mulher virou mais uma carta e com a voz doce porém cortante disse:
Desço escadas que sobem enquanto um pássaro sem asas com quatro patas nada atrás de mim. Por mais que eu corra não consigo me afastar do animal. Vejo uma seta e um homem com uma mala na mão, ele me dá uma chave prateada. A chave é uma porta que mesmo pequena ainda me permite entrar, porém o animal grande demais fica preso do outro lado da entrada. Estou em uma praia e meus pés gelam, minha boca seca procura a água do mar. Não a bebo e mesmo assim fico embriagado com o seu cheiro. O homem com a mala novamente aparece ao meu lado, dessa vez ele abre a mala e lá de dentro sai o pássaro, eu, bêbado, não consigo fugir. Ele me engole e lá acho Jonas. Pergunto aonde esta a saída e ele me aponta um canto, vou até o canto mais não vejo nada, ele trás um coração em sua mão esquerda que brilha iluminando o caminho. No canto vejo escrito a palavra fé. Pronuncio-a sem querer em voz alta, ela se contorce, Jonas se afasta, novamente o passaro surge e novamente me engole. Dessa vez o homem da mala é quem esta lá dentro, antes que ele possa abrir a mala eu pulo em cima dele o mais rápido que posso, afastando a mala pergunto lhe o que é tudo isso. O homem se transformado em peixe e responde: “é sur-real” e me engole de novo.
E as palavras não têm se ligado muito em me procurar.
Mas as imagens, ah!, essas sim eu sempre tenho por perto.
Elas vão e vem num piscar de olhos e mesmo assim me atingem como uma parede de concreto. A arte é dura com aqueles que a fazem tanto quanto com aqueles que a procuram. Amante rebelde que a todos agride e mesmo assim é por muitos procurada. Não seria a filosofia uma arte desgastada? Já está na hora do novo subistituir o velho. Por uma filosofia material.
(tudo o que foi feito para agradar também pode ser feito para ofender, então...)
- Foi bom pra você? -Você jamais saberá...
Tudo que não tem palavra. Não se diz. Nem se sabe si se sente (quanto “s”). Talvez tenhamos certeza de sentir, mas na medida em que não encontramos palavras pra dizer também não encontramos formas de mostrar. A não ser através de mais sentimentos. Afinal, se o que sentimos conseguimos fazer com que o outro sinta, ele ao sentir estará sabendo que não tem palavras. Porém nosso problema é cíclico. Continuamos na iminência de não saber em que medida, o que outro sente é o mesmo de que acabamos de nos dar conta de que sentimos e que tentamos fazê-lo, o outro, sentir. Talvez não possamos. Talvez não desejemos. Talvez não possamos nem ao menos querer. Talvez seja preciso nós contentar com o fato do prazer ser individual e individualizante. Talvez isso já seja um começo. Mas acredito estar mais pro fim.
...o f u t u r o s ó p a s s a p a r a a q u e l e s q u e j á n ã o o p o s s u e m e m s u a s mãos, aqueles que o controlam o tem sempre no presente...
Com o cigarro na boca e um balançar de copo que fazia as pedras de gelo tilintar ele balbuciava palavras que Mary não entendia. Mas fosse o que fosse as palavras pareciam dançar ao seu redor.
Uma escada, uma escada sem fim. Ao redor escuridão. Só a escada é clara para nos. Podemos ver a alguns degraus de distancia, não mais que isso. A cada passo que damos o degrau de baixo desaparece, não podemos voltar. Se quisermos podemos não subir, porém depois que colocamos nosso peso em um degrau e retiramos o peso do outro não podemos mais voltar atrás. Certos degraus nos assombram. Nunca sabemos qual será o ultimo nem quando aquele lá atrás irá voltar. Sim, é como se eles caíssem, e caindo alguns parecem novamente acertar a escada. De alguns não queremos nos desfazer, tentamos agarrá-los ou simplesmente não sair deles. Mas infelizmente temos de continuar subindo. Continuar sempre enfrente. Pois assim é a vida.
Pequena Nota – Não sei se os poucos leitores deste blog sentiram minha ausência no ultimo domingo, mas mesmo assim venho dizer-lhes que o motivo foi ter eu adoecido e que agora já me encontro curado. Quanto ao post de hoje, sei ser confuso e provavelmente sem um final ainda. Não sei quando continuarei essas historia que cada vez se alarga mais, porém quando o fizer podem estar certo de que a postarei por essas bandas daqui. Um Grande Abraço a todos.
Ensaio Circense- Doppelgänger
Doppelgänger - Crime
Uma noite quando me dirigia para o lugar onde nos encontrávamos, que mudava obviamente de cidade para cidade, mas que era sempre no lugar mais alto que conseguíamos encontrar, ouvi uma discussão, uns barulhos secos e um grito. Corri, chorava enquanto corria, não sabia porque chorava nem porque corria. Minha consciência me dizia que não era ele, sempre se atrasava, não tinha por que ser ele. Quando me aproximei da clareira que ficava no alto de uma colina vi uma pessoa em pé com um pedaço de madeira na mão, enxuguei-me das lagrimas e gritei a pessoa perguntando-lhe se estava tudo bem, a resposta me deixará mais preocupado do que poderia imaginar. A pessoa em pé era Eu. Quando me aproximei ele, que na verdade era eu, largou o pedaço de pau e começou a correr. Quando cheguei ao topo do morro vi. E era ele. Era Philip, meu amor. Morto, com a cabeça rachada sangrando mais do que deveria alguém que tivesse qualquer perspectiva de viver. Só naquele instante pude perceber o quanto o amava, o quanto queria que ele voltasse a viver, o quanto eu simplesmente o queria. Era ele. Ele.
Meu tio então apareceu ao meu lado, com a mão ensangüentada, e a camisa também, tocou me o ombro, não me lembro dele ter me perguntado nada. Mas com certeza deve de telo feito. E eu só podendo responder-lhe o que fiz devo telo dito que eu o havia matado. Não me lembro, e nem sei se quero me lembrar. Só sei que quando me dei por mim novamente estava ensacando o corpo de Philip, era ele, meu amor. Morto. Era ele. Ele. Meu tio me explicava o ocorrido, me dizendo, enquanto apontava para Philip e o chamava de bastardo, que ele vinha aqui para encontra-se com minha tia, que os dois tinham um caso e que sedo ou tarde aquilo iría acabar acontecendo. Então era verdade, eu havia matado Philip. Eu havia descoberto tudo e por isso o matara. O que eu não entendo é como Philip poderia ter me enganado daquele jeito. Todos no circo sabiam, menos meu tio, que minha tia tinha um caso era com meu Pai e não com Philip, será que ele me traiu?
Minha cabeça estava a mil. Philip estava morto, e isso eu jamais poderia mudar e nem quem o matará que era ninguém menos que eu mesmo, nos os artistas de circos somos vistos como os ciganos eram vistos antigamente, enquanto nos apresentamos somos maravilhosos, porém a vida que não se restringe as duas horas de show, somos meros ninguens pessoas a margem sem direitos ou deveres, sempre nos olham entranho nas cidades. Enquanto ajudava meu tio a ensacar o corpo que não parava de sangrar pensava no que deveria fazer. Cavamos uma cova rasa, ali mesmo onde nos últimos meses me encontrará com Philip, ajudei meu tio a fechar o buraco e voltamos para o circo. Na volta ele me aconselhou a não contar a ninguém o que eu, havia feito. Era tarde, todos dormiam, tomamos banho e queimamos as roupas, daqui a uma semana iríamos embora daquela cidade e ninguém mais poderia nos acusar de qualquer crime, me dizia meu tio, que continuava dizendo ser quase impossível que –lhe achassem o corpo.
O hoje é o dia seguinte ao fato que estou a contar. Escrever. Por que escrevo? Pra quem escrevo? Amasso folhas de papel em branco, desejo escrever, preciso escrever. Escrevo para revelar o mal entendido, para proferir o meu amor por Philip, para parar de sofrer. Porém essa dor no meu peito não cessa, é a dor de um amor perdido antes mesmo que eu tivesse a consciência de tê-lo tido. Assino a folha e deixo dentro do trailer de Philip no bolso de sua camisa. Apanho uma muda de roupa e com a cara ainda maquiada pego carona num ônibus que vai dar na praia, quero ver o mar. O palhaço quer mergulhar.
Ele chegou numa manhã de terça-feira, eu cortava o capinzal para que pudéssemos armar a tenda. Era trapezista, chamava-se Philip. O circo não precisava de mais, éramos pequenos e gostávamos assim, mas também era real que meus tios estavam envelhecendo, e no circo só quem pode envelhecer é o palhaço, este tende morrer rindo. E exatamente por isso Charles contratou Philip, meu tio não gostou nada da idéia, e sendo minha tia dez anos mais nova do que meu tio, ele acabou rapidamente, depois de alguns meses, o substituindo. Mas isso não foi o pior, Philip acabou se aproximando muito da minha tia, afinal treinavam juntos quase que o dia inteiro e depois se apresentavam à noite. Eu também me aproximei bastante do nosso novo trapezista, afinal tínhamos quase a mesma idade era natural que isso acontecesse. Nos dias de folga saímos juntos à noite para comemorar a apresentação bem sucedida ou simplesmente por não agüentarmos mais as cercanias do circo. Quando não estávamos treinando ficávamos conversando, seja sobre a noite anterior ou sobre qualquer assunto que se possa imaginar, ele era fantástico, sabia muita coisa do mundo e conversava sobre o que quisesse sem parecer idiota, as garotas o adoravam. Todos no circo o adoravam, ele possuía um poder de sedução extraordinário que a todos encantava, a exceção de meu tio, que cada dia que passava parecia mais carrancudo e infeliz de um jeito que eu jamais imaginei ver.
A beleza do prodigioso trapezista era indiscutível. Não sou homossexual gosto muito da visão do corpo feminino, do cheiro do corpo feminino, mas ele de alguma forma também me seduzia, não saberia explicar. Um dia quando voltávamos bêbados de uma pequena festa de uma cidade do interior rolamos morro a baixo em uma ribanceira que de tão bêbados e de tão escura nem quando terminamos de rolar conseguíamos vê-la direito. Lá embaixo bêbados e doloridos ficamos deitados por uns dez minutos rindo sem parar. Quando conseguimos parar de rir e olhamos para o céu ficamos atônitos com a beleza que as estrelas produziam em nossos espíritos mesmo tão distante de nossas cabeças. Nos beijarmos não passou de conseqüência da beleza do momento somada a ternura encadiada pelo álcool. Todavia as conseqüências foram além daquele dia. No dia seguinte quando nos sentamos em um lugar distante e deserto, para conversar sobre o ocorrido do dia anterior e estabelecermos nossas próprias masculinidades afirmando de forma cristalina nossa heterossexualidade, acabamos por fazer sexo. Era noite de lua cheia, nos enrolamos na tenda que estava desamarrada, pois no dia seguinte partíamos. A escuridão nos protegeu dos olhares alheios. Todos dormiam e as luzes da pequena cidade onde estávamos não chegavam a nos iluminar. Não nos víamos nem a um palmo de distancia. Não nos víamos, apenas nos tocávamos. E tenho de confessar-me a meu heterossexual interior que foi muito bom, e ele há de concordar. A partir daquele dia começamos a namorar em segredo, nos beijávamos escondidos, não por vergonha ou medo do que os outros poderiam pensar, mas por medo e preconceito de nos mesmos que imaginamos que o que sentíamos um pelo outro poderia muito bem acabar de um dia para o outro. E acabou.
Continua...
Imagem de Marc Ferrez
A vida itinerante - Ensaio Circense Independente apesar de interligado, igual a vida.
Homem. Mulher. Outro homem, outra mulher. Muitos. Será possível que eu tenha em mim ambos o sexo? Será possível que eu abarque em meu corpo mais de um? Olho-me no espelho e não reconheço homem nem mulher, entretanto reconheço a mim. Um homem me fala ao pé do ouvido, enquanto uma mulher ajeita-me a roupa. Estou pronto para entrar, pelo menos é o que pensa meu pai. Subo no meu monociclo e girando sobre minha cabeça cinco garrafas de vidro atravesso a cortina vermelha. O circo esta cheio, pessoas que não conseguiram lugar se amontoam na armação de ferro que concebe a escada, sentadas nos degraus olham-me com um ar sorridente, estão todas aparentemente felizes. Recebo as gargalhadas do publico, mas não sei do que riem, será que por de baixo dessa maquiagem não percebem eles a minha tristeza? Enquanto pedalo em círculos lembro-me dos acontecimentos recentes, que tem transformado minha vida em um pesadelo concreto.
Chamo-me P., vivo no circo desde que nasci, não digo que more no circo, pois nunca ficamos mais de um mês em lugar algum, a exceção duma ou outra vez quando vamos a capital. Minha mãe faleceu assim que nasci e meu pai, de nome Charles, é o apresentador e faz tudo da parte administrativa do circo. Ele e meus tios, por parte de pai, foram muito novos para o circo, logo que minha mãe engravidou. Eles tiveram de fugir do meu avô que queria matar meu pai por ter deflorado sua pequena filhinha, minha mãe na época tinha dezesseis anos. Os meus avos eu não conheço nem por foto, todavia não sinto lá muita falta dessa família, o circo sempre foi uma grande família pra mim. Da minha infância não tenho do que reclamar, sempre me diverti, afinal era eu uma criança no circo. Fui crescendo e o encanto, tenho de confessar, foi perdendo o brilho, já não possuía mais aquele fascínio. A adolescência passou sem muitos conflitos além do normal. Bebida, cigarro e mulheres. Até o dia em que ele chegou.
Ouvi o barulho das garrafas caindo no chão. Só tinha uma ainda intacta que segurava com a mão esquerda. Rapidamente vi Charles, apresentador e palhaço principal, que possuía a metade do circo e era o chefe por ser também o mais antigo. Quando consegui virar o monociclo em sua direção percebi que ele carregava uma torta, e obviamente não era para ninguém ali dentro daquela tenda comer, mas sim para sujar o palhaço. Recebi a tortada e sendo impossível me manter ainda equilibrado fui ao chão. A platéia ria de se acabar enquanto eu me acabava nos cacos de vidro. Sem problemas, ossos do oficio. Sai discretamente enquanto entravam meus tios já encima do mastro principal. Enquanto me dirigia para o lado de fora da arena vi que já acendiam a roda de fogo, onde meus tios teriam de cruzar para, num instante, darem as mãos e se salvarem da queda livre factivelmente provocada pela deusa Gravidade, a mãe de todas as quedas. Sempre que via aquela roda em chamas lembrava-me do cuspidor de fogo que sempre me dizia quando jovem que “a roda de fogo para qual nos atiramos deixa de ser a roda da morte e passa a ser à roda da vida, da vida renovada, no momento em que do outro lado retorna o artista”. Sabias palavras de um homem que passou a vida toda engolindo fogo para ter do que comer e por fim morreu queimado no seu próprio erro. Corda bamba do circo que de um instante para o outro delimita quem vive e quem morre, sempre no último instante, e no silêncio do publico assustado padece a morte real do artista que não encontrará porto seguro para mais uma vez ser ovacionado pelas palmas da platéia.
Todavia deixemos essas vicissitudes de lado, o meu problema era muito maior; talvez não tão grande quanto o do engolidor de fogo, que não tem mais volta, todavia maior no sentido que também não tem solução. E então naquele momento comecei a viver essa história, que lhes escrevo agora e em verdade.
"- Você me ama? - Você é meu filho. - Mas você me ama? - Mais ou menos... - Hum... - E você me ama? - Daria tudo pra ter metade do talento que você tem...Eu tenho talento? - Não. - Nenhum? - Nenhum. - Quando foi que você perdeu o interesse em mim? -...Vamos embora hoje... - Mas eu não posso ir hoje... - Você gostou dela, menos mal, pensei que fosse gay..."
(livre adaptação de “xxy”)
Eu, o outro. Norma, a exceção. Simples, o complexo. Toda minoria já sentiu o que é não fazer parte de um grupo. Todo grupo sabe o que é desprezar um outro grupo. A multiplicidade de nossa espécie não está em nosso gênero nem em nossa raça, essa noções existem, mas são extremamente ínfimas perante uma diversidade do que aqui chamarei de cultural. Cultural em um sentido mais abrangente de opinião, onde gostos, tendências, religião, mídia, e etc, tudo se mistura e influi no eu, toda complexidade do outro. Ele não deixa de ser Eu e nem o outro de não ser ele, mas nessa invasão muito do que somos se choca com o que gostaríamos ou não de ser, de forma resumida, com tudo o que não somos. O ser humano é volúvel acima de tudo, e nessa volubilidade adquirimos o dom da escolha, o dom de trilharmos nosso próprio caminho, e visto a grande gama de opções a qual nos impõem o mundo não podemos dizer hoje que escolhas sejam feitas de forma errada ou certa dentro de um padrão moral e social que é tão fragmentado e múltiplo quanto o próprio homem. Mas então por que certas ações ainda tanto nos chocam, será que é porque batem de frente com o que somos e com o que não queremos ser? Será que é quando o outro faz algo do qual não admitimos pra nos é que não conseguimos compreendê-lo? É no limite que se impõem a relação social, a relação humana, no limite do que não sou que vejo o outro se formando.
“Chuvia chuviscos, e no charco chapinhava o petiz”
Agora eu entendi, e como é bonito. Engraçado pensar que a preguiça em tentar te entender possa ter me privado do sublime prazer. Titularei este escrito como parceria, pois não pretendo criar nada onde não vejo nada que lhe falte, também não posso chamar de filosófico, pois não pretendo pensar ou refletir mais simplesmente expor sentimento. Assim é parceria por ter me despertado algo, da mesma forma que tantas outras coisas que já li. Não que haja por traz da frase ou por traz desse comentário qualquer interesse que não o estético, e ademais posso dizer do espanto estético. Não sou um homem de poucas palavras, não me apego a palavra alguma, porém gosto de telas por perto, entretanto confesso que dessa frase pouco compreendi. A linguagem travava minha apreciação e isso me inquietou, afinal precisamos ou não ter pré-conceitos, pré-informações, para que algo belo nos atinja? Mas também tenho de confessar que algo na frase me penetrou e ai mora minha inquietação, como por traz da frase cujo sentido não compreendi por completo algo possa ter me atingido. Afinal se não compreendo, o que me atinge? Tenho mais perguntas do que respostas, mas isso não torna a questão difícil só faz com que nela fiquemos mais tempo pensando. E esse tempo eu não meço no relógio, mas sim no menino, nesse tempo infinito da velha infância.
Depois de tudo o que eu tenha dito o leitor não venha ter um espanto como o meu, ou a imagem não lhe assole de maneira tão forte, mais o que eu disse, o que me inquietou já deve ter inquietado o leitor em outros momentos em outras leituras.
Imagem de Henri Cartier-Bresson
Gritado Por:
Ailatan Do Contrario - http://contrariandoocontra.blogspot.com/
Adrian Troccoli - http://criticareconstrutiva.blogspot.com/
Minhas leituras mudaram, meus interesses também. Mesmo assim sinto que não mudei. Confedero-me o mesmo e isso me angustia. A vida parece afundar em uma areia movediça no meio de uma exuberante selva amazônica. Eu vejo a sua imensidão, onde minha vista não alcança eu sinto ainda faltar muito para essa imensidão acabar. Sinto me pequeno, sinto me impotente também. Pequeno perante a imensidão e impotente por estar dentro da areia movediça. Sim, estou dentro e quanto mais me mecho mais longe fico da borda, mais longe de me mover verdadeiramente. Afinal afundar não é se mover, se aqui aplico uma metáfora não existe melhor metáfora do que a da areia movediça para representar a vida. Quanto mais você vive mais perto esta de morrer. E infelizmente só podemos ir até onde nosso corpo e mente alcançam só o que neles vivemos. Casca de arvore que nos impe de voar. E que vá para o inferno os aviões, as aves é que são livres, levemente livres.
Quantas cartas já não rasguei, quantos bilhetes não entreguei, quantos arquivos (porque não) eu apaguei. Tudo por medo de que eles virassem portas que dessem dentro do meu peito e estando lá dentro você no simples tocar ferisse o que eu penei tanto há costurar. Ai do poeta que diga que nas suas palavras mais benditas não estão, se não por inteiro em partes, todo o seu pesar, todo o seu amar, toda sua alma. Por isso não escrevo em versos, eles nos desnudam nos revelam por inteiro. O poeta que muito escreveu já de todo se descreveu mais do que jamais uma bibliografia poderia querer. Quando escrevo em verso faço por ironia a mim mesmo em nada me revelando, me escondendo entre as linhas do humor irônico.
Devo confessar que sou um João de barro frustrado. Se na cadeia de pássaros existe uma ordem lá do alto nos olham os João de barro, e isso é inegável. Porém eu sempre quis ser beija flor e sair de flor em flor só tirando delas o que elas tem de valor. Infelizmente a natureza me fez diferente e eu fui destinado a ser João de barro que mesmo querendo só consegue da flor seus espinhos. Maldita mãe natureza que se mostrará a mais cruel das madrastas. Mesmo assim não posso negar meu amor por você, deve ser algo de útero ou quem sabe cordão umbilical. Mas se não mudares não me dá escolha que não me matares.
- Alo, to deixando o girassol e já estou voltando pra casa. - Volta com Deus, se não morrer antes. . . . Não peça mais que uma vez...
No detalhe destruímos tudo que o geral fez questão de construir.
(...)
PS.: Texto sem contexto, frases sem pretexto não tente contextualizar.
Nada, nenhuma idéia genial nem ao menos um pensamento furtivo. Mas tenho que escrever; era o que ela se dizia todo dia. Linda e inteligente por natureza. Delicada e safada por esporte. Sedução não era para ela um jogo, mas um prazer; nem ela própria entendia seus motivos e por isso também não devemos tentar entendê-los. Era simples em roupas fúteis e fútil em lugares simples e assim se destacava. Aliais se não se destacasse por isso se destacaria por todo resto. Era uma criatura fascinante. Seus cabelos entre meus dedos deixavam um cheiro que me faria lembrar dela por semanas. Nesta noite estava eu em seu apartamento. Enquanto eu trocava de canal ela, nua, na escrivaninha resmungava a sua necessidade de ter de escrever. Quando lhe perguntei o por que dessa necessidade ela me respondeu o que para muitos pode parecer escatológico, mas para mim pareceu apenas um exemplo necessário. Disse que escrever para ela era como espremer uma espinha, você pode não espremê-la e deixar que ela se desfaça sozinha ou pode simplesmente pressioná-la até que ela ecloda e de lá saia todo o pus. Se ela não escrevesse aquela espinha dentro dela eclodiria ou sumiria em algum momento, agora se ela pressionar até que saia o pus ela terá todo controle sobre aquele sentimento. E era isso que ela queria, total controle.
Perguntei então se estava faltando algo pra ela. Então ela se levantou, e aqueles seios tesos com bicos estendidos do carinho que o ar gelado do ar-condicionado lhes fazia caminharam pela sala até a estante. De costas se agachou e se agachando vi toda a conformidade das curvas de suas pernas em aquiescência como a lombar onde no centro saltavam-me aos olhos a marca do biquíni já um pouco perdida pelos tempos de inverno que se tem feito durante o dia. Novamente se levantando estendia um charuto ao qual aceitei e um cinzeiro. Abriu a garrafa de wishk e em dois copos serviu até a metade. Foi até a cozinha de onde voltou com três cubos de gelo em cada copo. Sentando na cama acendemos os charutos e brindamos. Uma hora depois eu cansado de tanto transar dormia, enquanto ela encostada nas costas da cama com minha cabeça em seu colo escrevia em um caderno velho palavras que eu nunca cheguei a ler. Quem sabe sentimentos perdido, ou novos sentimentos adquiridos.
Hoje lembrei tudo o que você já me fez sofrer, e novamente voltei a beber. Acho engraçado como velhas lembranças podem trazer velhos hábitos. O habito que eu tinha de me amar passou pra você, mas você nem notou. Perdi velhos amigos e você achou que eu nem liguei. Ganhei novos amigos e você achou que eu me perdia de você. Ela nunca foi presa a mim, sempre foi muito independente, porem necessitava que eu dependesse dela, sendo assim acho que de alguma maneira ela dependia sim de mim, sem ser aqui de forma alguma demagogo. Sua independência nunca me incomodou, pois sempre fui muito mais independente, talvez daí a necessidade dela de me prender. Ela morreria e não conseguiria, foi o que eu pensei, mas era eu que morria aos poucos. Minha felicidade passou a ser a dela, se ela não estava feliz eu ficava triste, com o tempo isso passou a acontecer sempre. Sempre que não concordávamos ela se entristecia, e como isso me machucava. E eu continuava a morrer.
Só que minha independência, o ao menos o que sobrou dela, me deu novas amizades, novos amores, novos desejos. E o eu que morria ficava apenas na parte que a ela pertencia, como um braço que apodrece, você tem duas escolhas deixar ele tomar seu corpo ou cortar-lhe fora. Eu acho que se dependesse só de mim eu todo apodreceria. Só que eu não pertenço a mim mesmo. “Cada uma (pessoa) que passa me leva um pedaço. E todas juntas não me fazem inteiro.” Dizia a mim mesmo um dia desses. Eu que sempre achei um problema não ter amizades, amores, desejos, eternos descobri que é por ser eu feito de partes, partes eternas enquanto durarem. Eu não escolho esse período, nem as pessoas, ele simplesmente acontece. Perdão aqueles que se afastaram, um perdão maior ainda aqueles que eu afastei, mas saibam que de todos só guardo boas lembranças e desejos de que retornem e de que se vão novamente, nesse fluxo interminável vocês me formam.
Conhecerei ao mundo inteiro, sem nunca me dar por inteiro, o mundo só me conhecerá em parte. Essa é a minha sina, esse será meu pecado.
Para que vocês possam apreciar a cena faço questão de imobilizá-la. Estamos dentro de uma joalheria, que fica na esquina da rua Farticio Brito com a Santo Afonso. A porta giratória que dá a entrada da loja fica milimetricamente no centro do espaço onde funciona a loja. Se estamos olhando esta porta de frente vemos a nossa esquerda a vitrine e a nossa direita a porta utilizada pelo gerente para abrir a loja pela manhã. Esta assim que aberta é logo em seguida fechada pelo próprio gerente, os demais funcionários, fornecedores e clientes entram impreterivelmente pela porta giratória que possui um sistema anti-furto que é ligado quando o gerente adentra a loja por volta das sete da manhã; e desligado apenas quando esse deixa a mesma por volta das oito da noite.
Porém a porta de uso próprio do gerente encontrasse aberta. Agora caro leitor, peço que atentem a dois detalhes, o primeiro é que estamos com o tempo estagnado e por isso nos demoramos tanto em mostrar-lhes os detalhes, coisa que em velocidade normal não nos permitiria dizer quase nada; a segunda coisa que peço para que atentem é o relógio, são sete e dez, não a motivo algum para que esta porta esteja aberta ainda a uma hora dessas. Mas vamos entrar, por favor, me acompanhem. No centro da loja temos uma cúpula que nos revela o item de mais valor dentro da loja. É um cordão de ouro branco com rubis pendurados por toda a sua extensão. Contornando a loja um longo balcão se perpetua - relógios a nossa esquerda, anéis à direita e colares e pulseiras a nossa frente - a exceção de onde estamos e de dois cantos onde encontramos dois pequenos bancos. Neles estão sentados Marcos, que devo lhes apresentar como sendo o gerente, e Milena, sua filha.
Pode-se dizer que Milena se parece com o pai em algum sentido, que seja na primeira letrado nome e no fundo branco dos olhos. E que agradeçamos aos céus por isso. Ela uma bela morena, um pouco acima do peso é verdade, mas que de pernas cruzadas sentada no banco com uma cara um pouco assustada e também amassada, pelo fato de ter acabado de acordar, era inegavelmente a coisa mais linda dentro daquela loja. E sem que tenhamos de fazer qualquer analogia a bela e a fera estava ao lado de uma das coisas mais feias, seu pai, o gerente. Baixinho e careca, daqueles que penteiam o cabelo da esquerda pra direita como se isso burlasse qualquer reflexo do espelho que se transformara sua cabeça em formato de bola de bilhar, o gerente estava sentado de cabeça baixa como que pedindo que tudo aquilo não demorasse. Se sua filha estava, em nossa perspectiva, um pouco acima do peso com certeza seu pai está um pouco acima do limite de obesidade. Apesar de não aparentar seus cinqüenta anos aquele homem carregava nos olhos, ou talvez na testa, um casamento infeliz de mais ou menos vinte cinco anos, e se há algo que podemos ver na testa daquele homem são os desgastes desse relacionamento, que o deixara com diversas fendas de preocupação, entretanto ele católico fervoroso preferiria mais vinte anos infelizes a um Deus descontente em seu encalço.
Voltando a cena como um todo, temos a cúpula central a qual nos dirigimos assim que entramos na loja, esta está com seus vidros estilhaçados, mesmo que ainda nenhum dos estilhaços tenha tocado o chão, podemos dizer que isso logo ocorrerá. Dois homens encapuzados se encontram perto da cúpula. O primeiro à esquerda da cúpula com um martelo golpeia-a fazendo a estilhaçar, seu nome é Charles e ele trabalha no cinema de frente para a joalheria, mais ainda ninguém sabe disso, só nos e André o outro encapuzado que se encontra à direita da cúpula e aponta uma arma a cabeça de nosso já famoso gerente. Sei que já estou me tornando enfadonho mais peço ao leitor um pouco mais de paciência pos já estamos acabando. Na parede de fundo da loja vemos encima do balcão a caixa registradora que parece ansiar pela funcionária que só chegará quase duas horas depois e nem trabalhará hoje. No meio da parede vemos um porta que dá para um banheiro e para a saída dos fundos que quase nunca é usada já que nosso gerente morre de medo de que possam usá-la para assaltá-lo, grande ironia que é a vida na cena em que nos encontramos. Atrás desta porta, que se encontra entre aberta, vemos a sinueta de uma pessoa que também parece estar armada. Vamos nos aproximar enquanto podemos e matar a nossa, ao menos a minha, curiosidade de saber quem é. Atrás da porta encontrasse o policial da décima nona DP cabo Resende, que esta a paisana e rente à parede. A sua frente vemos a porta do tal banheiro, e nas suas costas a porta dos fundos que não parece ter sido arrombada por ele.
“Diante de uma imagem imensa as palavras se tornam meras coadjuvantes.”
Novamente me propus a escrever mais, até que esta frase que está ai em cima virasse um curta. Porém novamente tendo dela uma visão assim, meio de longe, me parece ter formado um quadro tão belo que não tenho coragem de dar-lhe nem mais um ponto. Não tendo escolha prefiro novamente me referir a esse texto como sendo um curtíssimo, do que alongar o que já foi dito de forma tão breve.
Imagem de Henrique Bernardelli(1857-1936)
Messalina
Oil on canvas
Public collection
Ps: Me refiro ao texto do dia 11 de janeiro de 2009 -